sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

NEGROS! RESISTÊNCIAS NA BAHIA DO SÉCULO XIX

RESUMO

O referido texto tem por objetivo apontar as mais variáveis formas de resistência do negro contra a escravidão na Bahia do século XIX. Inicialmente descrevendo as condições pelas quais estes povos africanos passaram até  chegarem aqui no Brasil e a forma pelo qual foram tratados durante toda a escravidão em sua estadia como escravo no Brasil colonial e Império. Descrevendo toda a situação de opressão, humilhação, esclusão, dominação e castigos pelos quais passaram e sofreram. Mas o foco principal deste artigo é de mostrar toda a indignação e revolta destes povos  por sofrerem a imposição deste tipo de vida  pelos europeus, mostrando toda a sua repúdia através de lutas constantes pela almejada liberdade através de resistências as mais variadas possíveis, desde fugas, abortos, assassinatos, criação de quilombos (refúgios para os negros fugitivos), rebeliões e revoltas individuais e coletivas até o suicídio. Como também as Leis que foram criadas de cunho libertador, que não foram estas a causa da Abolição mas foram os primeiros passos para a tal sonhada Liberdade que também fora  precionada principalmente pelas ações distintas dos negros escravos e os já homens livres. Mostrando que o homem negro não era aquele ser passivo, acomodado e até mesmo “selvagem” e “sem alma” como os brancos os denominaram, e sim, mostrar um povo guerreiro, astuto, com sentimento, religião e cultura própria que não foge a luta quando o assunto principal  é a sua liberdade a busca pela indentidade roubada, desde a vinda  dos primeiros navios negreiros que aportaram no Brasil  ainda no século XVI.




Palavras Chaves: Escravidão,Resistência, Quilombos, Liberdade,




NEGROS! RESISTÊNCIAS NA BAHIA DO SÉCULO XIX
SÔNIA MARA DOURADO MARTINS




“Quando eu me lembro do estalar do chicote, meu sangue corre gelado, lembro-me do navio de escravos, quando brutalizavam a minha alma”.  Bob Marley
A História nos tem mostrado muitos acontecimentos, pelos quais constituíram o nosso país. Um destes certamente o mais importante foi à implantação da mão de obra africana denominada de escravidão, devido às condições precárias de serviço imposta a esta população. Desde o século XVI foram trazidos homens e mulheres africanos, tirados de sua terra natal como animais, onde já dominavam a agricultura, pecuária, sabiam trabalhar os metais, tinham conhecimento com a metalurgia, ou seja, eram vistos como a prosperidade desta nova nação que surgia em meio à “selvageria” dos Índios e das matas.
Viajando em condições subumanas nos navios negreiros, que tanto pavor causou ao poeta Castro Alves, tratados aqui de maneira brutal e violenta, vivendo em permanente estado de coação, foram trazidos como mercadoria valiosa, pois cada homem e mulher saudável comprado custavam caro, sem respeito nenhum por sua singularidade já que veio pessoas de várias nações africanas cada um com a sua língua, costume, religião, ou seja, seu modo de organização, de vivência social e política das múltiplas Áfricas que compõe o continente africano. Era de se esperar que os negros buscassem de maneira sistemática e continuada a sua liberdade monopolizada. 
Vieram contra a sua vontade, pra uma terra distante e desconhecida, deixando pra trás toda uma história de vida. Vida estas, que se dividiam em status, prestígios, posições sociais, (já que relatos de historiadores comprovam que chegaram aqui príncipes, princesas, reis, rainhas, guerreiros... de várias nações africanas) para se submeterem a escravos dos brancos europeus.
Posição esta que era da lavoura pra senzala, do mato (capturando gado) pra senzala, da cidade (escravo de ganho) pra fazenda ou do engenho pra senzala, esta era a vida cotidiana, e sem contar que quando desagradava seus senhores eram castigados com os mais cruéis castigos possíveis. Como nos informa MATTOSO:
O castigo mais suave que um senhor pode infligir a um escravo é o de prendê-lo, em geral acorrentado. Mas, cada fazenda possui suas gargantilhas, golilhas, máscaras de ferro e seus troncos que prendem pescoço e artelhos e até imobilizam durante dias e dias o escravo condenado. O tronco e o chicote são os castigos preferidos dos senhores. (...) Até 1824 as mutilações de escravos desobedientes eram autorizadas: marcas a ferro em fogo, esmagamento de dedos por algemas de tarrachas, corte de orelhas, amputação parcial dos pés, não eram raros. Mas o chicote não perde a condição de instrumentos preferido da repressão e seu uso somente é abolido em 1886. (...) ( p156, 2003)

A violência legal e ordenadamente utilizada pelo branco como meio de conter o escravo, gerava o medo, mas, também a revolta e formas de resistências por parte dos escravos reprimidos a tais castigos cruéis. Com esta condição imposta de vida, estes sujeitos nunca foram apáticos a esta situação. O conhecimento que já temos sobre a história da escravidão nas Américas serve para comprovar que os escravos não foram pessoas passivas e acomodadas. “(...) Mal foram postos a trabalhar, os negros começaram a escapar do controle dos senhores, criando comunidades de fugitivos no interior do país (...).” (MANN e HECHT, p.74, 2012)
 Apesar da dificuldade que muitos historiadores e estudiosos no assunto, encontram pela ausência de documentos que representam a operacionalização e desenvolvimento da escravidão no Brasil, dando ênfase que a classe dominante queria mesmo era apagar da memória de todo brasileiro a violência e a crueldade praticada com estes povos. Tornando difícil também ver os relatos da luta escrava pela liberdade na Bahia, atrapalhando a pesquisa para desenvolver um trabalho minucioso e melhor embasado do tema.
Em vista disso que ao longo de nossa História tem sido uma prática comandada pelos estudiosos do processo de libertação dos escravos brasileiros, a eliminação do papel desempenhado pelo negro no decorrer da luta travada no país pela abolição da escravatura, nas literaturas que aborda este tema. Envolvidos com a Historiografia Oficial, distanciados da realidade ditada por mais de três séculos de escravidão, é que grande parte dos estudiosos e pesquisadores cometem o equívoco imperdoável de ignorar, e mesmo subestimar, a permanente luta do africano escravizado pela sua liberdade, daí a dificuldade encontrada por muitos pesquisadores de ver o negro como agente do processo de libertação.
É verdade que o escravismo provocou, em teoria e mito, no ilusório senhorial de que os milhões de pessoas (mulheres, homens jovens e adultos, idosos e crianças) removidos da África, não deveriam participar ativamente na determinação dos rumos de suas vidas nas fazendas, engenhos e cidades que funcionavam com a energia de seu trabalho. “O trabalho escravo era um fator estrutural da economia brasileira, tanto que o seu controle interno se fazia cada vez mais rígido.” (BOSI, p. 205, 1992) Contudo a História atual vem nos mostrando o contrário sobre a participação dos escravos no processo ativo e participativo pelo fim da escravidão. Embora a queda oficial da escravidão só tenha ocorrido em 13-05-1888, a luta do escravo pela sua libertação antecede e transcende o Ato da princesa Isabel.
Todavia, desde o momento em que chegaram, têm mostrado inquietações, indignações com a condição de vida oferecida a eles. Muitos começaram a fazer camaradagem com senhores, para conquistar a simpatia e assim no futuro a tão sonhada liberdade com um documento chamado Carta de Alforria (era um documento cedido a um escravo por seu proprietário, tipo de “atestado” de liberdade em que o proprietário abdicava dos seus direitos de posse sobre o escravo. Este último, após a Alforria, era chamado “negro forro”) documento de valor legal registrada em cartório, ou redigido por quem de direito com o intuito de conceber liberdade ao escravo, ficando assim, o escravo estaria liberto após cumprir as condições estabelecidas e condicionadas pelo seu senhor no documento que para eles, ela era um dos meios mais simples para sair do cativeiro, levando em consideração que as cartas de alforria representavam um dos aspectos do resistir escravo.
Somente ao tornar se homem livre, ou ao menos quando começa a divisar a possibilidade de alforriar-se, é que o escravo cruza a passagem que transforma o prisioneiro infeliz num ambicioso alerta, movido por uma esperança tenaz. (...) através da astúcia, arma eficaz dos fracos e dos oprimidos, que possibilita ao escravo fingir-se obediente, fiel e humilde ante seus senhores, fraternal e digno junto aos companheiros de servidão. (...)(MATTOSO, p.167, 2003)

Outra manifestação visível de resistência foi a de conseguir enganar os europeus com suas astúcias em relação à religião, onde estes tiveram a malícia de relacionar seus santos cultuados na África com os santos católicos cultuados e respeitados pelos europeus, sinal de não aceitação da religião imposta, que também deu origem as irmandades (organizações religiosas), a estas eles devotavam toda a sua fidelidade a sua terra natal, “raça”, cultura, costumes, mantendo segredo. Como retribuição os líderes destas irmandades garantiam aos seus seguidores poderes importantes como:
 O de ficar invisível aos olhos dos brancos e as balas não atingirem        seus corpos. E os cativos, os seus “fiéis seguidores,” acreditavam.
Com seus rituais, poderes, apetrechos de ferraria, patuás e santos de origens tão diversas, esses líderes mostravam que estavam em curso poderosos de adaptação das diversas culturas africanas às condições do Brasil (...) que também produziam lógicas próprias e poderes no interior das senzalas. (...) (MACHADO e GOMES, p28-29, 2010)

Atitudes estas que causavam bastante medo aos seus senhores, também quando estes descobriam que “um escravo era “feiticeiro” ou “médico”, conhecedor das ervas ou magia, com frequência apressa-se em vendê-lo tal é o seu temor ao envenenamento gradual (...).” (MATTOSO, p. 157, 2003) Muitos usavam e abusavam deste conhecimento com as ervas pra se livrarem do cativeiro de diversas formas: envenenamento de capitães do mato, feitor, senhores brancos com o “mau olhado” (cuja força pode provocar até a morte deste com tanta eficiência como uma flecha envenenada), envenenamento de si próprio (suicídio) e para abortos... Pois:
qualquer conjunto de práticas escravas e negras, de um modo geral - ações, relações pessoais e estratégias-, que no período vislumbravam a liberdade como uma possibilidade concreta. Liberdade entendida aqui, não só como a possibilidade de se livrar do cativeiro, mas também como a construção de estratégias cotidianas que transformassem a dureza da vida escrava e negra em algo menos insuportável. (MATTOS, p.147, 2008)

Outro motivo de obstinação ficava por conta do trabalho pesado, vigiado, açoitado quando não feito direito, é que muitos destes homens e mulheres acabavam fugindo das fazendas onde eram escravizados, formando povoamentos chamados de Quilombos, unidos em um espírito de resistência “O escravo “em fuga” não escapa somente de seu senhor ou da labuta, elide os problemas de sua vida cotidiana, foge de um meio de vida, da falta de enraizamento no grupo dos escravos e no conjunto da sociedade. (...)” (MATTOSO, p.153, 2003) como também utilizava da esperteza e ginga trazida da África junto com as batucadas do atabaque e outros instrumentos de percussão, a capoeira que era visto como dança por alguns, mas, que aqui serviu de luta (arma) contra os capitães do mato, senhores que com golpes gingados e bem elaborados os assassinavam numa tentativa de livrar desta condição imposta a eles sem mais e nem menos.
Alcançar a liberdade, resgatar sua identidade furtada, se manter num cotidiano de existência que desse sentido a uma vivência social, cultural e humana era tudo que almejavam, já que experimentou em longo prazo um modelo de vida imposta, assinalada por dominação, discriminação, exclusão e castigo. Sendo estes os objetivos da população negra no Brasil colonial, para tentar alcançá-lo utilizaram múltiplas formas de estratégias, incluindo desde as pequenas infrações individualizadas até as mais graves e coletivas, desde a sua chegada aqui, mas, é no século XIX que estas manifestações de resistência vão ficando mais frequentes visíveis e fortes em todo o país e particularmente na Bahia.
A história da resistência ao cativeiro na Bahia é tão antiga quanto à implantação da mão de obra escrava no Brasil. Pensar na escravidão em Salvador no século XIX é o mesmo que pensar em conflitos sociais e raciais envolvendo instituições e sujeitos, este último na busca pela liberdade. Infelizmente uma das práticas mais comum entre os negros de obstinação era o suicídio uma expressão violenta de não aceitação e a não adaptação do que lhe foi imposto. O suicídio era cometido por não haver mais saída, era um momento de desespero, com mais frequência entre os escravos da cidade embora estes gozasse de uma vida mais autônoma em vez dos que estavam situados nas fazendas. As razões para tais atitudes como nos informa MATTOSO eram:
 (...) impossibilidade de queixar-se à justiça de maltratos recebidos, incapacidade de pagar ao senhor a soma estipulada no contrato do escravo “de ganho”, acusações falsas, medo de ser vendido para longe, insucesso numa tentativa de fuga, roubo descoberto, etc. É o medo, sempre, que leva ao suicídio, um medo vingador para o qual todos os métodos são válidos: asfixia engolindo a língua, enforcamento, estrangulamento, geofagia.(...) Pois o escravo decidido a morrer perde apetite, emagrece e morre: é o famoso “banzo”, suicídio lento, doença da saudade.(...)( p. 155, 2003)

 Somente na metade do século XIX que começa a crescer a ideia da abolição fortalecida pelas leis criadas a favor dos escravos como Lei Eusébio de Queiroz (foi idealizada desde 1831 e aprovada em 1850), Lei do Ventre Livre (1871), Lei do Sexagenário (1885). Sendo estas não cumpridas na íntegra o que leva escravo e escravos a se rebelarem com mais coragem, confiança e esperança.
“Até meados do século XIX, o discurso, ou o silêncio de todos, foi cúmplice do tráfico e da escravidão”. (BOSI, p.217, 1992). A Lei Eusébio de Queiroz aprovada em 1850 veio para acabar com esta omissão, tinha como objetivo acabar com o tráfico negreiro, diminuindo a compra e escravização de povos oriundos da África. Como o próprio Eusébio de Queiroz ministro da Justiça e ex- chefe de polícia do Rio de Janeiro testemunhou sobre a lei que leva o seu nome que finalmente deu fim ao tráfico depois de tantos enfrentamentos com o governo britânico:
Sejamos francos: o tráfico, no Brasil, prendia-se a interesses, ou para melhor dizer, a presumidos interesses dos nossos agricultores; e num país em que a agricultura tem tamanha força, era natural que a opinião pública se manifestasse a favor do tráfico: a opinião pública que tamanha influência tem, não só nos governos representativos, como até nas próprias monarquias absolutas (...). (NABUCO, pp117-8, 1977 apud BOSI, p.216-7,1992)

O tráfico pode até ter sido eliminado, mas a desculpa de ser praticado estaria presente ainda nas vozes dos fazendeiros e dos ex-traficantes de escravos, cujos sujeitos tinham sido obrigados a proibi-lo de vez.
Com a implantação de Lei do Ventre livre, conhecida também por “Lei Rio Branco” que foi promulgada em 28 de setembro de 1871, muitas africanas começaram a ter mais liberdade e coragem em por seus filhos no mundo, antes elas quando grávidas muitas buscavam o preparo de ervas com propriedades abortivas, muitos abortos foram provocados durante a escravidão, esta era mais uma forma de resistência radial. Mas, com a implantação da Lei seus filhos poderiam nascer livres sem precisar viver aquela vida que lhe foi obrigada a viver, como estar escrito na: LEI Nº 2040 de 28.09.1871 – LEI DO VENTRE LIVRE:
A Princesa Imperial Regente, em nome de S. M. o Imperador e Sr. D. Pedro II, faz saber a todos os cidadãos do Império que a Assembleia Geral decretou e ela sancionou a lei seguinte:
Art. 1.º – Os filhos de mulher escrava que nascerem no Império desde a data desta lei serão considerados de condição livre.
§ 1.º – Os ditos filhos menores ficarão em poder o sob a autoridade dos senhores de suas mães, os quais terão a obrigação de criá-los e tratá-los até a idade de oito anos completos. Chegando o filho da escrava a esta idade, o senhor da mãe terá opção, ou de receber do Estado a indenização de 600$000, ou de utilizar-se dos serviços do menor até a idade de 21 anos completos. No primeiro caso, o Governo receberá o menor e lhe dará destino, em conformidade da presente lei.
Já a Lei do Sexagenário ou Lei Saraiva Cotegipe, promulgada em 28 de setembro de 1885,  concedia liberdade apenas aos escravos com mais de 65 anos, que já não dispunham de força e disposição para encarar as péssimas condições de trabalho cedidas pelos senhores de engenho, se caso conseguissem chegar a esta idade já que a estimativa de vida de um escravo era de 40 a 45 anos. A Lei dos Sexagenários como todas as outras pode não ter sido decisiva para o fim da escravatura, mas fez parte de uma cadeia de avanços abolicionistas que culminariam na assinatura da Lei Áurea, em 1888.
Ao estudar e pesquisar livros e artigos sobre a temática ficou claro que uma das manifestações de resistência mais conhecida em todo o Brasil era mesmo os Quilombos, mas, inúmeras outras modalidades de revoltas de escravos eclodiram em diversos pontos de nosso território, neste período de formidável resistência dos oprimidos se inscreve a Revolta dos Malês, ( - O termo “malê” é de origem africana  (ioruba) e significa “o muçulmano”. Foi um movimento que ocorreu na cidade de Salvador  na Bahia entre os dias 25 e 27 de janeiro de 1835. Os principais personagens desta revolta foram os negros islâmicos que exerciam atividades livres, conhecidos como negros de ganho (alfaiates, pequenos comerciantes, artesãos e carpinteiros). Apesar de livres, sofriam muita discriminação por serem islâmicos. Os revoltosos, cerca de 1500, estavam muito insatisfeitos com a escravidão africana, a imposição do catolicismo e com o preconceito contra os negros. Portanto, tinham como objetivo principal à libertação dos escravos e  também acabar com o  catolicismo forçado.                                                                                  .          
            Os revoltosos saíram do bairro de Vitória (Salvador) e se reuniram com outros. Invadiram os engenhos de açúcar e libertaram os escravos.
Depois de denunciados  os soldados cercaram os revoltosos na região da Água dos Meninos,
que da janela do Forte os alvejavam a bala. No conflito morreram sete soldados e setenta revoltosos. Os líderes (os pretos nagôs Diogo, Ramil, James, Cornélio e Tomás) foram condenados a pena de morte. Os outros revoltosos foram condenados a trabalhos forçados, açoites e degredo (enviados para a  África). Talvez tenha sido esta a maior manifestação de resistência coletiva (demonstração de união e força) dos escravos, que provocaram sérias preocupações aos seus senhores.
Dentro dessa perspectiva é que os "quilombos ou mocambos" representam considerável acervo no painel das lutas travadas pelos escravos na busca incessante de sua libertação. Foi constatado a existência de quilombos ou mocambos em quase todo o território baiano como em (Xique-Xique, Rio das Contas, Santo Amaro, Nazaré, Jacuípe, Maragogipe, Cruz das Almas, Andaraí, Jaguaribe e outros), os principais quilombos existentes em Salvador, Quilombo do Buraco do Tatu (1744-1765), Quilombos de "Nossa Senhora dos Mares" e "Cabula", Quilombo do Urubu (1826)
           Os quilombos que na língua banto significam povoações, eram redutos afastados dos centros urbanos, que reuniam principalmente ex-escravos negros que fugiam de seus senhores em busca de liberdade. Eventualmente, alguns índios e brancos pobres também habitavam os quilombos. Geralmente, localizavam-se em locais de difícil acesso, como no meio de matas ou em montanhas. Seus habitantes, chamados “quilombolas”, formavam comunidades que buscavam manter suas tradições religiosas e culturais; alguns chegavam a reproduzir a organização social africana. Sobreviviam por meio da pesca, da caça, da coleta de frutas e da agricultura; também praticavam o comércio dos excedentes com as populações ao redor, pois os quilombos se comunicavam entre si.
Dando ênfase ao Quilombo do Urubu por se tratar do período pesquisado, Conta-nos José Alípio Goulart apud Manuel Antônio Santos Neto:
Em 1826 “formou-se um grande quilombo chamado URUBU, no sítio Cajazeira, nas proximidades da Capital”. Os documentos da época dizem que os quilombolas do URUBU premeditavam apresentar uma revolução na Cidade. No dia 15 de dezembro de 1826, praticaram alguns ataques no Cabula contra lavradores, raptando uma menina que com sua família passava numa roça no dito sítio, e que dois dias depois foi encontrada muito maltratada e recolhida ao Hospital da Misericórdia. (...) soldados e um cabo, sabendo estarem "os negros” reunidos em um lugar denominado URUBU, em número de mais ou menos 50, cercaram o local e uma luta travou-se ao meio-dia, tendo falecido os capitães Antonio Neves e José Correia, segundo informa Clóvis Moura. (...) Os sentinelas dos quilombolas pressentiram a presença das tropas, imediatamente se puseram em guarda e deu o alarme, a batalha se desenvolveu entre uns 30 soldados e uns 50 calhambolas, estes usando como armas facões, facas, lazarinas, lanças, e mais outros instrumentos curtos. Portanto, uma luta de vida e de morte aos gritos de MATA! MATA! Lançando-se furiosos sobre os soldados (...). Destacaram-se sobremaneira nesse embate uma escrava chamada Zeferina, lide arco e flecha nas mãos, lutando ferozmente, até ser presa. (...) Em documento dirigido ao Chefe da Polícia, um dos comandantes das tropas encarregadas da destruição do Quilombo do URUBU, José Balthazar da Silveira, relata: "prendi a negra Zeferina, a qual se achava com arco e flecha na mão”, e achei três negros mortos e uma negra, e alguns sacos de farinha e bolacha, e como já fosse noite (...) deixei perto do lugar o Sgto. e soldados de Pirajá, para observar qualquer movimento que houvesse. Este documento é datado de 17 de dezembro de 1826. (GOULART, José Alípio. Os Quilombos, Revista Brasileira de Cultura, vol. 6, 1970, pp. 129/141)

É notória a importância dos quilombos como forma de resistência negra desde seu surgimento. Os quilombos foram um dos vários elementos que mostram uma das maiores lutas dos negros para a conquista da liberdade, talvez tenha sido o mais importante movimento de luta para a busca da liberdade. O exemplo admirável da negra Zeferina que de arma em punho cedeu caro a derrota, as múltiplas formas encontradas pelos insurretos para combater a violência e a escravatura.
 Depois de várias leituras foi possível verificar e analisar de forma bem sucinta, um pouco da vida e da luta deste povo guerreiro que não se deixa abater diante da opressão, humilhação, tentativa de aculturação, repreensões e variadas formas de castigos. Mostrando que desde que chegaram aqui, conseguiram mostrar e impor sua repudia ao sistema que lhe foram impostos a viverem de variadas formas, usufruindo o que já conheciam e adquirindo novos conhecimentos para lutarem pela liberdade e assim os fez.
Se é correto afirmar que as Leis Eusébio de Queiros, Lei do Ventre Livre e a Lei do Sexagenário, conquistadas através do desejo insano de abolicionistas e a pressão estrangeira (Inglaterra principalmente) como também a Revolta dos Malês, as formações de Quilombos, que foram as principais resistências coletivas ou se  as fugas, os suicídios, os abortos, a compra de alforrias de cunho mais individual, levou o governo a legalizar a condição de Libertos, mas, teve importante  contribuição, disso não tenhamos dúvida.
A pressão da Inglaterra por um lado que necessitava de consumidores para seus produtos recém-industrializados (já que o Brasil era o único país americano que ainda mantinha a escravidão) e a participação do negro nestes movimentos serviu como força para o aceleramento da tão sonhada liberdade que só foi promulgada e legalizada no dia 13 de maio de 1888, através da Lei Áurea,( "Áurea" quer dizer "de ouro" e a expressão refere-se ao caráter glorioso da lei que pôs fim a essa forma desumana de exploração do trabalho) A sanção ou aprovação da lei foi, principalmente, o resultado da campanha abolicionista que se desenvolvia no Brasil desde a década de 1870, mas não se pode negar o empenho pessoal da princesa Isabel, então regente do Império do Brasil, para sua aprovação. Primeira senadora brasileira e primeira mulher a assumir uma chefia de Estado no continente americano.
Através desta, a  liberdade total finalmente foi alcançada pelos negros no Brasil. Esta lei, assinada pela Princesa Isabel, abolia de vez a escravidão no Brasil. O maior legado que os africanos que chegaram ha quase quinhentos anos, nos deixaram foi à perseverança e a luta em alcançar os seus objetivos, e que isto sirva sempre como lição e fonte de inspiração para todos os povos brasileiros, nunca deixarem de sonhar.

 REFERÊNCIAS:
ARAÚJO, A. Ana Paula de. Lei do Ventre Livre. Disponível em:
Acesso em: 02/01/2013

BOSI, Alfredo. Dialética da colonização. - São Paulo: Companhia das Letras, 1992.

MACHADO,Helena P. T. e GOMES, Flávio. Para curar os males. Revista de História biblioteca Nacional. Ano 5. Nº 54. pp. 28-29. Março de 2010.

MANN, Charles C. e HECHT, Susana. Quilombos: Os herdeiros de escravos lutam pelo direito a terra. National Geographic. Ano 12.  Nº115. Pp. 70- 87. .Abril de 2012
           
MATTOS, Wilson Roberto de. Negros contra a ordem: Astúcias, resistências e liberdades possíveis (Salvador 1850-1888). 206 p.- Salvador-Ba: EDUNEB, EDUFBA, 2008.

MATTOSO, Kátia M. de Queirós. Ser escravo no Brasil: tradução James Amado. - São Paulo: Brasiliense, 2003.

NETO, Manuel Antônio Santos. Os quilombos de Salvador. Princípios: Revista teórica, política e de informação, ed. Nº. 8.- São Paulo: Anita Garibaldi, PP. 53- 58, 1 de maio de 1984. Disponível em:

O que é Quilombo. Disponível em:
WWW.significados.com.br/quilombo/ . Acesso em: 03/0102013
OLIVIERI, Antonio Carlos.  Lei Áurea: Princesa Isabel sancionou a lei que pôs fim à escravidão. Disponível em:

Revolta dos Malês: Insatisfação contra a escravidão e imposição religiosa. Disponível em:

SÉ, Carolina de Sousa Campos Sento. Carta de Alforria. Disponível em:

SILVA, Tiago Ferreira da. Lei do Sexagenário. Disponível em:
Acesso em: 02/01/2013

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